O primeiro episódio de Servant, “Reborn”, é tudo o que se espera de uma estreia assinada por M. Night Shyamalan. Ou seja, silenciosa, sufocante, cheia de lacunas calculadas e construída para deixar o espectador desconfortável desde o primeiro minuto. Em pouco mais de meia hora, a série estabelece uma atmosfera tão densa que a casa dos Turner parece respirar. Observando cada gesto dos personagens como se guardasse segredos próprios.
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A trama se apoia no trauma recente de Dorothy (Lauren Ambrose) e Sean Turner (Toby Kebbell), cujo luto não é revelado de imediato, mas sugerido com precisão quase cruel. Dorothy, vivendo em negação profunda, continua tratando o filho morto como se estivesse vivo. Já Sean tenta equilibrar pragmatismo e fragilidade emocional, incapaz de confrontar diretamente a esposa, mas desconfiando cada vez mais do abismo em que ela mergulhou.
Leanne Grayson
A chegada da nova babá, Leanne Grayson (Nell Tiger Free), é apresentada como rotina, mas rapidamente fica claro que ela é o detonador da estranheza que permeia a casa. Seu comportamento é simultaneamente gentil e perturbador, criando um contraste que faz o público questionar suas intenções desde o primeiro olhar prolongado, desde cada silêncio que dura um pouco mais do que deveria.

Um dos pontos altos do episódio está no uso magistral do silêncio. Shyamalan transforma longos momentos sem trilha sonora em instrumentos narrativos precisos. A casa parece maior, mais vazia, mais fria. E ao mesmo tempo, excessivamente íntima. Não há música para suavizar o luto ou anunciar o medo — ele simplesmente está ali, espalhado pelos corredores.
O choque que encerra o episódio é típico da assinatura do diretor: Sean, ao verificar o berço, encontra não o boneco terapêutico, mas um bebê real. A revelação não vem acompanhada de explosões dramáticas; ela predomina no olhar paralisado de Sean, no barulho do relógio, no ar suspenso que parece tremer. É a primeira quebra real entre o psicológico e o sobrenatural — e deixa claro que Servant brinca com a percepção do espectador desde o início.
Inquietante
Outro destaque está nas atuações. Lauren Ambrose entrega uma Dorothy ao mesmo tempo solar e partida, com uma felicidade ensaiada que se desfaz nos detalhes. Toby Kebbell traduz a impotência de quem tenta manter a família unida enquanto perde o controle da própria sanidade. E Nell Tiger Free cria uma Leanne misteriosa e indefinível: ela parece frágil, mas sua presença é tão forte que logo se torna o centro gravitacional da narrativa.
A direção reforça a casa como metáfora visual do trauma — planos fechados, corredores estreitos, sombras reais, iluminação natural que destaca imperfeições. Tudo é pensado para prender o público dentro daquele ambiente emocionalmente contaminado.
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Ao final, “Reborn” funciona como uma abertura impecável: inquietante, meticulosa, e construída para deixar perguntas no ar — muitas delas sem resposta imediata. A estreia já evidencia que Servant não é apenas uma série de terror sobrenatural; é uma investigação profunda sobre luto, negação, fé, manipulação e a fragilidade humana diante do inexplicável.
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